Poderia dizer que nossa juventude foi
conturbada, mas é mentira. Sempre fomos privilegiados, ainda que não
necessariamente ricos. Nosso relacionamento é que foi conturbado, intenso,
cheio de altos e baixos típicos de quem é muito jovem.
A começar pela nossa primeira vez. Você
bebeu para tomar coragem, e dormiu. Eu não tinha muita experiência, embora
tivesse mais do que você. Fiquei a te admirar, dormindo no chão da sala dos
seus pais, sob a luz da lua. Um silêncio, e eu sem saber se ia embora, se te
acordava, se simplesmente ficava ali.
Depois seus pais me levaram em casa. E eu
voltei mais e mais vezes. Tantos anos. 6 anos. Uma eternidade quando se é
jovem. Eu achei que minha juventude tinha acabado quando nos separamos. Ainda
na faculdade, achamos uma sala vazia para conversar. Dissemos as mesmas coisas,
derramamos as mesmas lágrimas, e foi cada um para um lado, sabendo que ainda
teríamos tempo ali, naqueles corredores, naquelas salas, para nos encontrarmos
todos os dias.
Na cantina, no ponto de ônibus, sempre um
sorriso triste e um aceno. E depois aqueles deslizes, as fofocas, as traições,
as brigas, as mentiras. Nunca conheci alguém que mentisse tanto e tão mal.
Sempre li dentro dos seus olhos, e você sabia que eu sabia. Mentia e sabia que
eu sabia. Tinha vergonha, mas mentia do mesmo jeito.
Pensando nisso agora, consigo lembrar de
tudo. De quando você roubou uma mulher de papelão de uma banca de jornais, capa
de uma revista de mulheres nuas, para “decorar” seu quarto. Você e todos os
amigos tiraram fotos com a mulher de papelão. Ridículos. E eu ria de tudo.
Depois também chorei de tudo. De quando
você viajou sem mim e voltou com fotos estranhas, e eu achei os negativos onde
você estava abraçado em outra. Ou quando você me apresentou à outra. E eu tinha
uma faca de caça na bolsa e quis usá-la em você. Chorei porque você me fez ter
vontade de matá-lo. Chorei porque você me magoou. Chorei porque você era tão
egoísta que não foi capaz de perceber tudo isso. E então ouvi de você: “você
não pára de chorar, não aguento mais!”.
Nunca as coisas poderiam ser lindas e
perfeitas porque nossas vidas não eram um filme. Eu fiz questão de ensinar meu
filho e meu neto a nunca magoarem ninguém, principalmente as mulheres que eles
amassem ou achassem amar. Creio ter conseguido, mas não sei se um dia saberei.
Creio que consegui porque meu marido nunca me magoou propositalmente. Sempre
pediu desculpas por qualquer deslize, o mínimo que fosse. Sempre preocupou-se
em mostrar que me amava, durante todos os dias que estivemos juntos. Muito mais
dias do que todos aqueles 6 anos em que estive com você.
Mas quando somos velhos não acreditamos
mais em eternidade. E nem a sentimos.
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