Querido Daniel,
lembra aquilo que falaste sobre nosso amigo? Aquele que sabe se proteger?
Balela. Ridículo.
Tu sabes, eu sei, ele mesmo sabe: não sabemos nos proteger. Achamos que evitar é uma maneira de nos protegermos, mas não é. Apenas evitamos, e mesmo assim não deixamos de sentir.
Um homem me escreveu uma carta, uma vez. Ele contou tudo o que ele gostava a meu respeito. Eu sempre soube que ele tinha sido a única pessoa no mundo que um dia viu quem eu era. Sabe o que eu fiz? Eu joguei a carta fora.
Medo.
E isso me protegeu?
Não. Só me fez sentir raiva de mim mesma.
Será que algum dia alguém escreverá outra carta parecida? Tudo me leva a crer que não. Tu achas que outra pessoa te escreveria cartas como eu?
Tu achas que realmente te proteges de alguma coisa?
Seremos atropelados, tu e eu.
O pior mesmo é que eu disse: tu já estás envelhecendo. Mas pelo jeito eu sequer ouço meus próprios conselhos. Porque não queremos ficar sozinhos, não queremos ficar sozinhos.
"Eu não preciso disso", ela me disse. Eu ri. Tu achas que não precisas também, não é mesmo? Mas mesmo assim não queres ficar sozinho.
Um amigo falou que precisa de carinho, amor e futuro. Não precisas? Não preciso? Mas é justamente essa mania indecente de ficar tentando adivinhar o futuro que me faz adoecer. Que te faz adoecer.
Desculpe-me se ainda tento ler o que não escreves. Se ainda tento ouvir o que não dizes. Megalomania. Tudo isso é porque insisto em gostar de ti. Fantasma que arrasta correntes aqui, dentro de mim. Meu coração explodiu, te contei? Verdade. Agora eu tenho uma colagem no peito, pedaços costurados, papel roto, sangue escuro.
Porque quando ele está aqui eu o amo. Mas se não está, é tudo negro. Sabes o que é isso?
Pode ser como me disseram: drama. Eu li num livro que isso é uma "janela killer", deve ser mesmo a vontade de morrer. Agora eu nem sinto mais.
Eu sei que faço drama, só que às vezes não consigo evitar. Ao menos eu não sinto tanto quanto antes, eu consigo explicar. Só não sei se sou entendida. Mas é mesmo simples, muito simples: cafuné, abraço e shhhhh. Cale a boca. Só isso. Chega de dizer bobagens, não acha?
Porque quando eu digo que não quero que me escrevas é porque meu coração, tolo, tem no fundinho a esperança infantil de receber uma carta tua.
Com amor e gosto de cereja,
C.
lembra aquilo que falaste sobre nosso amigo? Aquele que sabe se proteger?
Balela. Ridículo.
Tu sabes, eu sei, ele mesmo sabe: não sabemos nos proteger. Achamos que evitar é uma maneira de nos protegermos, mas não é. Apenas evitamos, e mesmo assim não deixamos de sentir.
Um homem me escreveu uma carta, uma vez. Ele contou tudo o que ele gostava a meu respeito. Eu sempre soube que ele tinha sido a única pessoa no mundo que um dia viu quem eu era. Sabe o que eu fiz? Eu joguei a carta fora.
Medo.
E isso me protegeu?
Não. Só me fez sentir raiva de mim mesma.
Será que algum dia alguém escreverá outra carta parecida? Tudo me leva a crer que não. Tu achas que outra pessoa te escreveria cartas como eu?
Tu achas que realmente te proteges de alguma coisa?
Seremos atropelados, tu e eu.
O pior mesmo é que eu disse: tu já estás envelhecendo. Mas pelo jeito eu sequer ouço meus próprios conselhos. Porque não queremos ficar sozinhos, não queremos ficar sozinhos.
"Eu não preciso disso", ela me disse. Eu ri. Tu achas que não precisas também, não é mesmo? Mas mesmo assim não queres ficar sozinho.
Um amigo falou que precisa de carinho, amor e futuro. Não precisas? Não preciso? Mas é justamente essa mania indecente de ficar tentando adivinhar o futuro que me faz adoecer. Que te faz adoecer.
Desculpe-me se ainda tento ler o que não escreves. Se ainda tento ouvir o que não dizes. Megalomania. Tudo isso é porque insisto em gostar de ti. Fantasma que arrasta correntes aqui, dentro de mim. Meu coração explodiu, te contei? Verdade. Agora eu tenho uma colagem no peito, pedaços costurados, papel roto, sangue escuro.
Porque quando ele está aqui eu o amo. Mas se não está, é tudo negro. Sabes o que é isso?
Pode ser como me disseram: drama. Eu li num livro que isso é uma "janela killer", deve ser mesmo a vontade de morrer. Agora eu nem sinto mais.
Eu sei que faço drama, só que às vezes não consigo evitar. Ao menos eu não sinto tanto quanto antes, eu consigo explicar. Só não sei se sou entendida. Mas é mesmo simples, muito simples: cafuné, abraço e shhhhh. Cale a boca. Só isso. Chega de dizer bobagens, não acha?
Porque quando eu digo que não quero que me escrevas é porque meu coração, tolo, tem no fundinho a esperança infantil de receber uma carta tua.
Com amor e gosto de cereja,
C.